Uma lei municipal aprovada em menos de 24 horas, em Campos dos Goytacazes, está gerando forte reação de produtores rurais. O texto aprovado altera a Lei Complementar nº 01, de 28 de setembro de 2017, para incluir a cobrança de taxas referentes ao serviço de inspeção municipal (SIM), atingindo produtores, agroindústrias, comerciantes e cooperativas rurais. Após ser procurado por lideranças do setor para falar sobre esta medida, o deputado estadual Vitor Junior (PDT), protocolou uma representação no Ministério Público solicitando que seja apurado a falta de participação popular no processo e os prejuízos diretos à economia rural do município.
O ponto central da polêmica é o Projeto de Lei Complementar nº 417/2025, enviado pelo prefeito de Campos, Wladimir Garotinho, à Câmara no dia 11 de novembro, às 10h44, sob regime de urgência, e aprovado já no dia seguinte, 12/11, após conceder aos vereadores um prazo de apenas 12 horas, durante a madrugada, para apresentação de emendas.
Além da velocidade incomum, o projeto não passou por nenhuma audiência pública, consulta aos produtores, nem participação de conselhos municipais, apesar de tratar diretamente de temas sensíveis: política agrícola, inspeção de produtos de origem animal, criação de nova taxa municipal e impacto econômico para pequenos produtores e agroindústrias familiares.
“O problema não é apenas o valor da taxa em si, e sim o novo sistema criado sem diálogo com o produtor, que burocratiza, duplica exigências e acaba aumentando o custo operacional dos pequenos e médios produtores. As taxas criadas pela nova lei são aplicadas sobre cada etapa da produção rural, como registro de rótulos, registro de estabelecimentos, análises sanitárias, inspeções e sobre o volume produzido ou abatido mensalmente. A participação popular é fundamental em qualquer processo político e legislativo e, certamente, com essa participação poderemos melhorar esse processo para todas as partes”, enfatiza Vitor Junior.
O vereador Dandinho de Rio Preto, parlamentar de Campos dos Goytacazes, reforça que a taxa chega no pior momento, aumentando custos de quem já enfrenta baixa rentabilidade, insegurança climática e queda na produção.
“É lamentável que a Prefeitura de Campos envie para a Câmara um projeto de lei que afeta diretamente os produtores rurais e, principalmente, o pequeno agricultor. Já não temos por parte do governo, investimentos em infraestrutura e as estradas vicinais do município não têm manutenção. Faltam tratores, retroescavadeiras e outros equipamentos essenciais. O governo deveria, em primeiro lugar, criar programas de apoio aos produtores antes de criar taxas que os prejudicam”, afirmou Dandinho.
O problema se agrava porque, segundo a própria legislação federal (Decreto 5.741/2006), a cobrança de taxa não é obrigatória para que a Prefeitura exerça o poder de fiscalização, nem para aderir ao SUASA ou ao SISBI, sistemas que permitem a circulação ampliada de produtos de origem animal.
O decreto federal é claro: os municípios “podem cobrar taxas”, mas não são obrigados, especialmente quando já dispõem de servidores e estrutura para isso, como é o caso de Campos, que possui cargos de médico veterinário e fiscal sanitário com atribuições específicas de inspeção.
A legislação brasileira exige consulta e debate público quando há formulação de políticas de interesse coletivo, e o tema agrícola é expressamente incluído. O Estatuto da Cidade determina a realização de audiências e consultas públicas (art. 43). Já o Plano Diretor de Campos reforça a obrigação de consultas, debates e participação popular (arts. 125 a 127).
E a Lei Orgânica do Município vai ainda mais longe e determina que políticas agrícolas devem contar com produtores, técnicos, trabalhadores rurais e suas representações (arts. 201 e 202); políticas industriais, comerciais e de serviços devem garantir participação dos setores produtivos (art. 172). Desta forma, nenhuma dessas etapas foi respeitada.
Se mantida, a taxa pode representar aumento de custos para pequenas agroindústrias; impacto na cadeia produtiva do leite, carne, pescado, ovos e mel; restrição de competitividade dos pequenos produtores frente às agroindústrias de maior porte; entre outros.


