IGOR GIELOW
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Desde a quinta-feira (19), as redes sociais moscovitas só falam de uma coisa: a instalação de sistemas de defesa antiaérea em prédios governamentais no centro da cidade, um sinal evidente de que o governo de Vladimir Putin está preocupado com a possibilidade de ser atacado em sua própria capital pela Ucrânia que invadiu em 2022.
Tudo começou com a circulação de uma fotografia de uma bateria de curto alcance Pantsir-S1 em cima do enorme prédio do Ministério da Defesa, que fica a 3,5 km a sudoeste do Kremlin, na margem oposta do rio Moscou ao famoso parque Górki.
Depois, um vídeo captou outro Pantsir sendo içado para o topo de um prédio do Ministério da Educação a cerca de 5 km a leste, no distrito de Taganski. A partir daí, pululam imagens do sistema de armas em outros pontos em torno de Moscou, como a cerca de 10 km da residência oficial de Putin, em Novo-Ogariovo.
“Dá medo, isso me lembra as história da minha avó na Segunda Guerra Mundial, quando havia baterias nos telhados”, disse por WhatsApp o jornalista Mikhail, que pediu para não ter o sobrenome divulgado. Ele mora perto de Taganski, e sua formação militar o faz especular que a posição daquela bateria em especial visa cobrir a aproximação a leste do Kremlin.
“Ninguém fala nada, isso é mau sinal, ainda mais depois do que aconteceu em Engels”, continuou, em referência aos ataques com drones de longa distância de origem soviética que Kiev promoveu contra a base aérea homônima, a 800 km da fronteira ucraniana. Houve também um ataque a meros 180 km de Moscou, que por sua vez fica a 450 km do país vizinho, dentro do raio de alcance das antigas armas ucranianas (1.000 km).
Nesta sexta (20), o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, foi instado por repórteres a explicar o que estava acontecendo. Não o fez, dizendo que assuntos de defesa deveriam ser discutidos com o ministério, que por sua vez não fez comentários.
Os Pantsir-S1 são sistemas de curto alcance e baixo altitude, a última das três camadas do sistema de defesa antiaérea russo: na longa distância estão o S-300, o S-400 e o novo S-500, enquanto na intermediária são empregadas baterias como a Tor-M1 e a Buk, entre outros modelos.
Moscou já era protegida por sistemas de longa distância, segundo analistas militares, mas a introdução dessas baterias, que protegeram estádios na Copa-2018, sugere a preocupação justamente com drones, menores e de mais difícil interceptação. O Pantsir-S1 teve um desempenho sofrível contra drones suicidas na guerra civil da Síria, mas desde então foram atualizados com novos radares e parecem ter sucesso na Ucrânia, onde estão sendo operados.
Eles atacam seus alvos com mísseis que têm alcance de 18 km de distância e 15 km, de altitude. Caso um drone ou míssil de cruzeiro escape, ele ainda conta com dois canhões de curtíssimo alcance para tentar abatê-los.
Alguns observadores pró-Kremlin parecem conformados com o sinal de insucesso militar que as baterias implicam. “Isso significa que [o governo] entende perfeitamente os riscos e entende que ataques contra Moscou e outras regiões são uma questão de tempo”, escreveu o jornalista especializado em assuntos militares Alexander Kots, alinhado a Putin. “É bom começar a planejar antes do que depois de um primeiro ataque”.
Seu colega de profissão Mikhail vê de outra forma a questão. “Se a guerra chegar a Moscou, será um enorme fracasso para Putin, ficará difícil de esconder o problema”, afirma. Quando esteve na capital no fim de outubro, a Folha viu pouquíssimas referências ao conflito iniciado em fevereiro passado pelas ruas da cidade, uma política deliberada do Kremlin.