SILVIA FRIAS
CAMPO GRANDE, MS (FOLHAPRESS) – “Preciso muito de ajuda. Sou vítima de violência doméstica e ontem meu companheiro me agrediu novamente. Meu filho entrou na frente pedindo para ele não me bater, e ele bateu nele também.” O pedido de socorro feito pela mulher em um bilhete levou a polícia a prender na última terça (27) o companheiro dela, suspeito de mantê-la em cárcere privado em Mato Grosso do Sul.
O bilhete foi entregue pelo filho dela, de dez anos, à diretora da escola municipal de Pouso Alto, distrito de Paraíso das Águas.
O suspeito, um peão de fazenda de 25 anos, foi preso e indiciado por cárcere privado e posse irregular de arma. O advogado dele, Alekssander Cardoso dos Santos, disse que o cliente nega as acusações. Ele vai aguardar a finalização do inquérito para avaliar a estratégia da defesa.
Segundo a diretora da escola, que pediu anonimato, a impressão inicial era de uma carta reclamando de professor, e não que seria um pedido de ajuda.
O menino chegou à escola e entrou na sala de aula às 7h. Cerca de 15 minutos depois pediu permissão à professora para ir até a diretoria.
Ele disse que somente poderia entregar o bilhete para a diretora, que seria ordem da mãe, segundo ela. A diretora lembra que a criança chegou apreensiva, com medo, “com a mãozinha bem fechada”.
Assim que entregou a carta, o garoto voltou à sala de aula e a diretora passou a ler. Ela conta ter ficado chocada, sem palavras, e que, em 25 anos na educação, nunca havia passado por situação semelhante.
Na carta escrita em metade de folha de caderno, a mulher relata, em 15 linhas, o histórico de violência. Diz que foi agredida, que não tem ninguém conhecido no estado e quer ajuda para ir embora.
“Ele ameaça me dar um tiro, por isso, preciso que me ajudem o mais rápido possível”, diz ela, em trecho da carta.
Assustada, a diretora entrou em contato com a Coordenadoria de Políticas Públicas para Mulheres. A partir daí, a rede de proteção foi acionada.
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Equipe do Conselho Tutelar de Paraíso das Águas foi até a escola, acompanhada da Polícia Civil de Água Clara.
Isso aconteceu depois que, segundo informações do conselho, foi identificado que o menino mora em fazenda na zona rural no município vizinho. A situação é comum entre as famílias locais, já que a escola mais próxima da região é a do distrito de Pouso Alto.
Na escola, de acordo com a Polícia Civil, o menino confirmou o teor da carta, escrita no domingo.
Contou que o homem é seu padrasto e falou sobre as agressões contra a mãe e de que ele também acabou sendo alvo: estava com lesão no lado esquerdo do rosto e mancha arroxeada perto do olho direito, resultado da tentativa frustrada de defendê-la.
Os conselheiros e policiais civis foram até a fazenda. Segundo o delegado Johanes Deguti, a equipe encontrou um ambiente limpo e organizado.
A mulher podia circular e cuidar da casa, mas era proibida de ter contato com alguém de fora, sendo limitada ao convívio familiar. A situação de cárcere era favorecida por ficar em área afastada na zona rural.
“Ela não tinha acesso ao celular e, quando falava que queria ir embora, o autor a ameaçava de morte”, disse Deguti.
Ela e o peão estavam juntos desde 2017 e tiveram dois filhos, um menino de 3 anos e menina de 1 ano, que estavam com ela na abordagem da polícia.
O homem trabalha na fazenda há cerca de um ano e meio. O delegado acrescentou que a mulher vivia “situação de violência doméstica há muito tempo”, mas não relatou o período ou quando começou.
Na casa, os policiais encontraram espingardas e munições e, por isso, o peão foi autuado por posse irregular de arma de fogo, além de cárcere privado.
A mulher e os três filhos receberam apoio do Conselho Tutelar de Água Clara, que assumiu o caso.
Segundo o conselheiro Rafael de Jesus Gonzaga, na madrugada de quarta-feira (28), todos foram levados para a casa de familiares dela, no interior de São Paulo.
Mais tarde, naquele dia, o peão passou por audiência de custódia e teve a prisão em flagrante convertida em preventiva, ou seja, sem tempo para expirar. Por enquanto, permanece em cela de delegacia, mas será transferido para presídio em Três Lagoas ou Bataguassu.
O suspeito se manteve em silêncio durante a audiência de custódia. Na quinta-feira (29), o advogado entrou com habeas corpus na Justiça, já negado em caráter liminar e, agora, aguarda o julgamento do mérito do pedido.
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