JOÃO GABRIEL
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A repercussão do caso da capivara Filó chegou também às redes sociais bolsonaristas, impulsionadas por fake news, e culminou na invasão de uma sede do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) neste final de semana.
Segundo o presidente do instituto, Rodrigo Agostinho, a invasão coloca em risco animais ameaçados de extinção e que estão no local para reabilitação. Para ele, a história tem sido usada como forma de resposta às operações de combate à madeira e gado ilegal no Amazonas.
“A rede bolsonarista está usando essa situação para atacar a gente”, afirma ele à Folha de S.Paulo.
“Estão atacando o Ibama porque temos muitas ações no Amazonas, de embargo de áreas desmatadas, apreensões de gado em terra indígena, em unidade de conservação. Esse caso acabou servindo para tentarem desqualificar o trabalho”, completa.
Segundo ele, o animal seria devolvido ao seu habitat natural logo após o feriado de 1º de maio.
A capivara Filó foi apreendida pelo instituto na última quinta-feira (27). Ela vivia com o youtuber Agenor Tupinambá, que fez sucesso nas redes sociais com o animal. Ele foi autuado porque a lei brasileira proíbe “exploração indevida de animais silvestres para a geração de conteúdo em redes sociais”.
Desde então, o caso ganhou repercussão. Neste final de semana, chegou a perfis como o da ativista Luísa Mell e de bolsonaristas como Mário Frias, ex-secretário de Cultura de Jair Bolsonaro (PL), e das deputadas Carla Zambelli (PL-SP) e Bia Kicis (PL-DF).
Desde sábado (29), dia em que a Justiça cencedeu uma liminar permitindo que Agenor visitasse o animal, manifestantes fazem atos em frente ao Cetas (Centro de Triagem de Animais Silvestres) do Ibama, em Manaus.
Uma das líderes do movimento é a deputada estadual Joana Darc (União Brasil), que gravou lives e vídeos convocando pessoas aos protestos e entrou no Cetas junto ao youtuber, ainda no sábado, quando muitos perfis passaram a propagar que a decisão era de devolução do animal, o que até então não era verdade.
Neste domingo (30), quando então uma nova liminar determinou a devolução da capivara a Agenor, a deputada invadiu o Cetas e agrediu verbalmente servidores do Ibama, que registraram o caso em boletim de ocorrência.
“Ali não é um hospital para visitação de pacientes. Temos a questão ainda que era o infrator visitando o objeto da infração”, diz Agostinho, que afirma ainda que vai recorrer da decisão.
Vídeos mostram a deputada invadindo o Cetas, ameaçando policiais e servidores e atirando uma chave, supostamente do Ibama, em um matagal. Em seus vídeos, ela afirma ainda que encontrou medicamentos vencidos e também vacinas.
O presidente do Ibama rebate, dizendo que os medicamentos eram para descarte e que o Ibama não vacina animais silvestres.
“Temos naquela unidade, em processo de reabilitação, alguns saguis de manaus, uma espécie endêmica da região e que é um dos dez macacos mais ameaçados de extinção no mundo. Eles estão ali para serem devolvidos à natureza e sofreram com o estresse. Aquele espaço não é feito para ter uma multidão de pessoas gritando em volta, muito menos dentro”, afirma Agostinho.
O presidente afirma que a gestão Bolsonaro sucateou diversos centros pelo país e que o instituto planeja inclusive reformar a unidade de Manaus, além de reabrir a de Belém, para ampliar o atendimento a animais silvestres.
Segundo ele, apenas neste ano, as 25 unidades de Cetas do país já receberam cerca de 15 mil animais, dos quais pouco mais de um terço já foram devolvidos à natureza.
“Chama atenção ver protetores de animais estão defendendo a pessoa e não o bem-estar do animal. Nas redes, não estão preocupados com um destino adequado para a capivara, com onde ela vai ser solta, se encontramos uma família de capivaras para ela”, diz.
Risco para animais
Nas suas redes sociais, Agenor postava sua rotina com Filó. Ele, que pelas suas postagens vive em uma fazenda, afirma que cuidava dela como indígenas em aldeias fazem com filhotes na selva.
Há cenas dele maquiando ao animal, tomando banho (aparentemente com shampoo) com o animal. Ele também aparece com outros bichos: bicho preguiça, jiboia, papagaio da várzea ou paca, por exemplo.
“Ele alimentou um filhote de bicho preguiça com frutas, sendo que o bicho preguiça não come frutas, e depois o animal acabou morrendo. Aquilo não é um caso de animais dentro de uma aldeia, a capivara estava sendo criada dentro de casa. Nem duvido que ele gostasse dela, mas não dá para normalizar a humanização excessiva de um animal silvestre, ultrapassou todos os limites”, diz Agostinho.
O presidente do Ibama diz que, nos últimos dias, já fez registro de mais 20 casos de pessoas utilizando-se de animais silvestres para conseguir engajamento nas redes sociais.