SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A humanidade vai acabar daqui a alguns milhares de anos, aposta o cientista Henry Gee, mas isso não faz com que ele fique acordado à noite, aterrorizado.
“Nós só estivemos na Terra por um pequeno período de tempo em comparação com toda a sua história”, diz o paleontólogo, editor da revista científica britânica Nature. “Chegamos muito recentemente e vamos embora em breve.”
Em seu livro “Uma História (Muito) Curta da Vida na Terra”, publicado em 2021 e lançado no Brasil agora pela editora Fósforo, ele constrói com metáforas espirituosas –em pouco mais de 200 páginas– uma viagem veloz pelos 4,6 bilhões de anos de vida na Terra, dos primeiros vestígios unicelulares aos complexos seres humanos.
Sua intenção ao escrever o livro não era ser um cavaleiro do apocalipse. Ele sempre teve a curiosidade atiçada por fósseis, rastros de espécies tão estranhas quanto a Titanoboa cerrejonensis, uma cobra do tamanho de um ônibus que viveu há cerca de 60 milhões de anos nas florestas da América do Sul.
Mais que isso, seu interesse está no que cada uma delas ganhava ou perdia em seus organismos a ponto de permitir que prosperassem, ainda que por pouco tempo, em um planeta que sempre foi e sempre será absolutamente hostil, com eras do gelo, cataclismos tectônicos e chuvas ácidas.
Na organização dessa história das espécies, Gee afirma que os seres humanos eram parte incontornável. Então, espanta como é minúscula a parte que cabe à humanidade nessa linha do tempo –cada trecho dela, um capítulo diferente.
Em um deles, o autor apresenta um pastiche do livro de Liev Tolstói, que ele apelida de “princípio de Kariênina”: “Todas as espécies felizes e prósperas são iguais. Cada espécie, quando entra em extinção, o faz à sua maneira”.
O autor quer oferecer uma perspectiva do que é a vida humana na Terra ao descrever a resiliência de algumas espécies, como as tartarugas, cujos ancestrais surgiram no Triássico, há mais de 200 milhões de anos e antes até dos dinossauros.
Também conta episódios que desafiam o senso comum, como quando ocorreu uma extinção em massa há cerca de 2,5 bilhões de anos porque cianobactérias começaram a soltar oxigênio na atmosfera –gás que era tóxico para a maioria das formas de vida que se desenvolveram até então.
Então, afinal, o que faz uma espécie vingar e outra não? Podem ser eventos e fatores causados ou não por ela. Até um meteoro fez sua parte.
“Tenho uma camiseta que diz: ‘Pare a tectônica de placas agora'”, diz Gee ao confrontar o slogan ambientalista “salve a Terra”. “A Terra é uma velha senhora, e ela viu muitas coisas em sua longa vida, muito mais destrutivas que os seres humanos”, completa.
Isso não torna menos urgente ou desimportante, segundo o autor, que a humanidade queira manter a sua casa limpa e preservar o que tem. “Temos o dever de ajudar a moderar as mudanças climáticas e cuidar das outras espécies do planeta enquanto estamos aqui”, diz.
As mudanças climáticas não serão a única causa do desaparecimento da humanidade, ressalta Gee. A falha de renovação populacional, com a queda da taxa de natalidade, terá efeitos econômicos e impactará a produção intelectual como um todo. “Se vamos usar a inovação e tecnologia para o bem, temos que fazê-lo muito rapidamente”, frisa o paleontólogo.
Longe de conclusões fáceis, ele lembra que “a emancipação das mulheres, que em parte causou [a queda da natalidade], também garante que nosso declínio aconteça da forma mais civilizada possível”. Além disso, ressalta que outros fatores intercedem por nosso fim: variação genética insuficiente, por exemplo, e perda de habitat pelo consumo desenfreado de recursos.
Em um último recado no livro, transmite uma mensagem pacificadora: “Não se desespere. A Terra resiste, e a vida ainda está viva”.
UM HISTÓRIA (MUITO) CURTA DA VIDA NA TERRA
Preço: R$ 89,90 (280 págs.); R$ 62,90 (ebook)
Autoria: Henry Gee
Editora: Fósforo
Tradução: Gilberto Stam