Crise do clima eleva pressão sobre Biden, que quebra promessas

FERNANDA PERRIN
WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – Quarenta e oito graus Celsius. Essa foi a sensação térmica nesta sexta (11) na cidade de Baton Rouge, capital da Louisiana, estado no sul dos Estados Unidos. Em outras 61 cidades americanas, como Orlando (Flórida), Austin (Texas) e Phoenix (Arizona), as previsões também apontavam para acima dos 40°C.

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No Havaí, ao menos 59 pessoas morreram em consequência dos incêndios florestais que atingem a ilha de Maui, a segunda maior do estado. Segundo o governador democrata, Josh Green, a tragédia é provavelmente a maior já enfrentada pelos havaianos em toda a sua história -no tsunami que atingiu o arquipélago em 1960, foram 61 mortos.

Diante dos eventos climáticos extremos, ambientalistas e lideranças da esquerda americana estão pressionando o presidente Joe Biden a declarar um estado de “emergência climática” em todo o país.

O objetivo da medida é ampliar a autonomia do Executivo no combate ao aquecimento global. Biden poderia adotar ações como suspender exportações de petróleo bruto e interromper perfurações sem depender do aval de outros poderes, segundo estudo do Centro para a Diversidade Biológica.

Questionado na terça se está preparado para declarar a emergência, Biden respondeu: “Eu já fiz isso”. Pressionado mais uma vez pela repórter a confirmar se a medida foi tomada, ele emendou: “Na prática, sim”. Só que não.

A repercussão foi ruim da esquerda à direita. Ativistas se revoltaram com a afirmação falsa, enquanto conservadores a usaram como munição contra o democrata. “É ridículo falar em emergência climática quando temos uma emergência na fronteira”, afirmou Tim Scott, senador e pré-candidato republicano à Presidência à Fox News.

“Biden disse que ‘praticamente’ já declarou uma emergência climática. Eu digo que ele precisa realmente fazer isso e seguir avançando”, escreveu Peter Kalmus, cientista para questões de clima da Nasa, autor de um duro artigo contra o presidente exigindo a declaração.

Junto com a melhora da economia, propagandear a política climática do governo era uma das prioridades da Casa Branca na última semana -a gafe de Biden ocorreu durante entrevista ao Weather Channel, o canal do clima. O tiro pela culatra ilustra o desafio do presidente nessa empreitada.
Enquanto a crença de que o aumento de temperatura da Terra é resultado de poluição gerada por ações humanas subiu dez pontos percentuais entre democratas na última década, ela caiu na mesma proporção entre republicanos, segundo pesquisa da Gallup.

“Clima e ambiente deveriam ser questões bipartidárias em todos os países, mesmo que exista discordância em como tratar esses temas”, diz à Folha Glada Lahn, pesquisadora de clima e sociedade do centro de estudos britânico Chatam House. “Os EUA em particular sofrem uma influência pesada do lobby corporativo daqueles que têm interesse no sistema atual, e os republicanos os ouvem mais do que os democratas. Então você precisaria de movimentos populares entre os republicanos para contrabalancear.”

A polarização tem resultado em aprovações históricas, mas também em concessões significativas de Biden no tema. Do lado das vitórias, a Lei para Redução da Inflação, que acaba de completar um ano, prevê, entre outras coisas, US$ 370 bilhões em incentivos fiscais para promover energia limpa. O objetivo é reduzir em 40% a emissão de gases do efeito estufa até 2030 em comparação com 2005, o que aproximaria o país do cumprimento das metas estabelecidas pelo Acordo de Paris.

Na outra ponta, a secretária de Energia, Jennifer Granholm, anunciou a construção das duas primeiras plantas industriais do país para “aspirar” dióxido de carbono da atmosfera. O que poderia parecer, a princípio, uma boa ideia, vem sendo criticado como um lobby caro e ineficaz da indústria do petróleo.

“Isso é útil para dar [aos produtores de combustíveis fósseis] uma desculpa para nunca pararem com o petróleo. Isso dá a eles uma licença para continuar a produzir mais e mais petróleo e gás”, afirmou o ambientalista e ex-vice-presidente democrata Al Gore sobre o projeto no mês passado.

Segundo ele, o custo do projeto é tão alto (US$ 1,2 bilhão) e o volume de energia necessário, tão grande, que faz mais sentido simplesmente prevenir as emissões de carbono.

Outra concessão importante que Biden teve que fazer para conseguir avançar sua agenda ambiental no Congresso foi autorizar, em abril, a perfuração de petróleo no Alasca, projeto que ficou conhecido como Willow. A reserva fica a cerca de 320 quilômetros do Círculo Ártico e deve render mais de 600 milhões de barris ao longo de 30 anos.

Segundo cálculos do jornal The New York Times, queimar todo esse combustível é o equivalente a colocar quase 2 milhões de carros a mais nas ruas todos os anos.

A manobra política também esbarra em promessas feitas por Biden durante a campanha eleitoral de 2020. Ele disse que, se eleito, pararia toda a perfuração de petróleo em terras federais, “e ponto final”. Disse ainda que explorar o combustível no Ártico seria “um grande desastre”.

Ao tomar posse, ele até chegou a cumprir sua promessa, mas decisões da Justiça derrubaram o bloqueio. Nos dois primeiros anos de mandato, foram concedidas mais licenças para perfuração em terras federais do que no mesmo período do governo Trump (6.900 contra 6.172).

Leia Também: ‘Bidenomics’ vira arma democrata contra Trump e alvo nas costas de Biden

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