SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Espanha e Portugal amanheceram com energia nesta terça-feira (29) após um dia de caos devido ao pior apagão da história desses dois países. No início da madrugada, quase todos os portugueses estavam com eletricidade novamente, enquanto mais de três quartos da demanda elétrica espanhola haviam sido restabelecidos.
Nas ruas de Madri, o retorno da energia elétrica foi acompanhado de aplausos e gritos de alegria dos moradores. Às 7h30 locais (2h30 no Brasil), 19 horas após o início do corte de energia, 99% do fornecimento elétrico estava garantido na nação, segundo a operadora REE (Rede Elétrica da Espanha). Por volta do mesmo horário em Portugal, 6,2 milhões dos 6,5 milhões de clientes da REN (Redes Energéticas Nacionais) já estavam com energia.
Houve relatos de problemas nas redes de energia em outros países também, porém em menor proporção. França, Bélgica e Andorra, por exemplo, registraram interrupções, e a falha não ficou restrita à Europa -durante a noite, a Groenlândia sofreu uma queda em suas telecomunicações, parcialmente controladas pela Espanha.
Apesar do alívio, a população ainda não tem respostas sobre o que causou a queda de energia. Ao longo da segunda, diversas hipóteses foram levantadas pelas autoridades, incluindo um ciberataque e um fenômeno atmosférico produzido por variações extremas de temperatura.
Essas possibilidades, no entanto, não se confirmaram e vinham perdendo força após a REE e o governo de Portugal descartarem uma sabotagem. O primeiro-ministro interino de Portugal, Luís Montenegro, anunciou nesta terça-feira que o seu governo solicitou formalmente à Agência da União Europeia para a Cooperação dos Reguladores da Energia (ACER) a realização de uma auditoria independente sobre o apagão que afetou a Península Ibérica.
Em entrevista coletiva, Montenegro enfatizou a urgência da situação. “Queremos uma investigação completa sobre as causas da falha. Precisamos de respostas rápidas e urgentes.”
Já o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, anunciou também nesta terça a criação de uma comissão que investigará as circunstâncias do apagão, enquanto um tribunal afirmou que vai apurar se houve “sabotagem informática”. Em um discurso na segunda à noite, Sánchez já havia admitido que as causas ainda não eram conhecidas e que não era possível descartar “nenhuma hipótese”.
Segundo o jornal El Pais, autoridades já tinham feito alertas para a possibilidade de um apagão generalizado. Há dois meses, a REE avisou investidores sobre o risco de interrupções graves com o aumento de energias renováveis. Na ocasião, a empresa argumentou que o fechamento de usinas convencionais, que utilizam carvão, implicaria em menor resiliência do sistema diante de imprevistos.
A falta de respostas já respinga na política, com partidos de oposição previsivelmente lançando dúvidas sobre o governo. A porta-voz do ultradireitista Vox, Pepa Millán, por exemplo, afirmou que o governo e a REE “estão plenamente cientes do que aconteceu e se recusam a nos contar”. “Eles não querem dizer porque o governo é o único responsável”, afirmou.
Já o conservador PP fala em criar uma comissão de inquérito no Congresso. “O governo precisa dar algum tipo de explicação. Anunciaram uma investigação interna; parece piada. Terá que haver uma comissão no Parlamento”, afirmou à emissora TVE.
Apesar das incertezas, o retorno da eletricidade foi comemorado nos dois países. Na Espanha, o tráfego ferroviário foi retomado em vários eixos, entre eles os movimentados Madri-Barcelona e Madri-Sevilha, segundo a companhia nacional Renfe.
A circulação continua, no entanto, suspensa em outras linhas importantes, já que as autoridades priorizaram a recuperação dos eixos suburbanos. Três trens ainda permaneciam bloqueados nesta terça de manhã na Espanha, segundo indicou o ministro dos Transportes, Óscar Puente. Além disso, o premiê aconselhou os trabalhadores não essenciais a não irem trabalhar nesta terça.
Em Portugal, o governo disse que os hospitais estavam funcionando novamente, os aeroportos estavam operacionais, embora com atrasos em Lisboa, enquanto o metrô da capital estava reiniciando as operações e os trens estavam circulando.
Entre os eventos públicos e privados que os portugueses tiveram de adiar por causa do apagão, um deles se destaca: o debate final entre os dois principais candidatos à vaga de primeiro-ministro. A contenda entre o social-democrata Luís Montenegro, atual ocupante do cargo, e o socialista Pedro Nuno Santos ficou para esta quarta-feira (30). As eleições estão marcadas para 18 de maio.
A falta de luz acabou se tornando tema eleitoral. “O mais grave é que também tivemos um apagão no governo central”, disse Santos. “Uma ausência de liderança, de orientação e apoio quando o país mais precisava. É nas dificuldades que se avalia a liderança e ontem não a tivemos.”
Montenegro rebateu: “O país teve uma resposta altamente positiva e forte face a circunstância grave, inédita e inesperada”.
Uma sondagem feita pela Universidade Católica para a Rádio e Televisão Portuguesa, o jornal O Público e a Rádio Antena 1 aponta que a Aliança Democrática, coligação que apoia o premiê, tem 32% das intenções de voto, contra 26% do Partido Socialista de Santos. A margem de erro é de 2,8%.
Em terceiro lugar, com 15% das intenções de voto, está o Chega, partido de ultradireita. Seu líder, André Ventura, também criticou Montenegro publicamente.