Falta de camas, lençóis, alimentos vencidos e até esgoto a céu aberto. Essas foram algumas das irregularidades identificadas durante uma fiscalização judicial nos abrigos Portal da Infância e Despertar, em Campos dos Goytacazes. As unidades, que são administradas pela Prefeitura por meio da Fundação Municipal da Infância e Juventude (FMIJ), foram interditadas por ordem da Vara da Infância e Juventude, com determinação imediata para a transferência das crianças e adolescentes para locais com estrutura adequada.
A vistoria ocorreu no início de junho e revelou um cenário alarmante de violações aos direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Foram encontradas situações como ausência de medicamentos e materiais de limpeza, falta de vidros nas janelas dos quartos, consumo de água fervida, refeições precárias à base de salsicha, linguiça e frango há meses, além da ausência de itens essenciais como cama e roupa de cama.
O juiz Márcio Roberto da Costa, responsável pela decisão, destacou que a interdição foi necessária para assegurar a dignidade e os direitos fundamentais dos menores acolhidos. “O ECA é uma lei que garante a proteção integral. A interdição de unidades é a aplicação da legislação, que tenho o dever de cumprir”, afirmou.
A decisão judicial também determinou a abertura de um boletim de ocorrência na Polícia Civil para apuração das responsabilidades sobre as condições encontradas nas instituições.
Ministério Público aciona Justiça
Paralelamente à decisão judicial, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), por meio da Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva da Infância e Juventude de Campos, ingressou com uma ação civil pública contra o Município e a FMIJ. O objetivo é garantir o abastecimento adequado de insumos em todas as oito unidades de acolhimento institucional sob gestão da fundação, que atualmente atende cerca de 150 crianças e adolescentes.
Segundo a promotora Anik Assed, durante diligências do MP, foram constatadas a ausência de itens básicos como proteínas (carnes brancas e vermelhas), leite infantil, papel higiênico e materiais de higiene e limpeza. “A falta desses insumos compromete a dignidade e o bem-estar dos acolhidos, em flagrante violação aos direitos previstos no ECA”, ressaltou.
O MPRJ solicitou, em caráter liminar, a regularização do fornecimento em até 24 horas, com pedido de aplicação de multa diária e afastamento de gestores públicos em caso de descumprimento.
O que diz a Prefeitura
Em nota oficial, a Prefeitura de Campos afirmou que a atual situação dos abrigos decorre de um desequilíbrio orçamentário causado pela suspensão dos repasses estaduais para o cofinanciamento na área da saúde desde o fim de 2024. Segundo o governo municipal, essa medida afetou diretamente as finanças públicas, exigindo ajustes em diversos setores.
Ainda assim, a nota reforça que o orçamento destinado à FMIJ permanece, proporcionalmente, acima da média per capita municipal, o que, segundo a gestão, demonstra o compromisso com a política de proteção social. A Prefeitura informou que nos últimos 30 dias foram realizadas mudanças no organograma administrativo e na presidência da fundação, e que os efeitos dessas medidas devem ser percebidos ao longo do segundo semestre.
A administração municipal também reafirmou o compromisso com a política de acolhimento e a manutenção do diálogo com as instituições envolvidas na proteção à infância e juventude.