(FOLHAPRESS) – A área técnica do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) afirma que uma eventual suspensão da licença de operação da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, levaria a prejuízos ao meio ambiente, à gestão ambiental do empreendimento e a graves consequências sociais na região.
Isso se daria porque medidas de controle de impactos, previstas como condições para a licença, seriam paralisadas, conforme o Ibama.
Os riscos são ainda maiores se, em decorrência de uma eventual suspensão da autorização, houver um deplecionamento -uma diminuição do volume de água- de dois reservatórios, segundo técnicos do órgão do governo federal.
“Este risco deriva do fato da imprevisibilidade técnica do deplecionamento completo dos reservatórios, por não haver prognósticos ambientais desse cenário, levando a situações para as quais não há medidas de controle, monitoramento, mitigação e/ou compensação nem sequer planejadas”, diz a área técnica do Ibama em nota, em resposta a questionamentos da Folha de S.Paulo.
O Ibama no governo Lula (PT) terá de decidir se renova ou não a licença de operação de Belo Monte, emitida em 2015. A usina funciona com uma autorização com prazo de validade vencido desde 25 de novembro de 2021.
Apesar das considerações feitas pela área técnica, ainda não há uma data prevista para a decisão, uma vez que prossegue a análise sobre o cumprimento de condicionantes impostas à hidrelétrica, cuja operação é responsabilidade da Norte Energia.
O órgão ambiental já havia apontado o desrespeito de algumas condições, como a adoção de medidas de mitigação dos efeitos do represamento, da formação de reservatórios e do controle da vazão de água na vida dos pescadores do médio rio Xingu, especialmente na Volta Grande do Xingu.
Em razão das falhas na mitigação por dois anos e dois meses, a Norte Energia deve promover reparação em dinheiro aos pescadores, concluiu o Ibama.
Uma reparação de R$ 20 mil vai contemplar ao todo 1.976 pescadores cadastrados entre 2017 e 2019 e identificados como impactados pelo empreendimento -1.405 já receberam a verba, segundo a Norte Energia.
Esse, porém, não é o total de pescadores que se viram sem peixes em suas comunidades. Outros 6.000 pediram para ser incluídos na lista da reparação, como a Folha mostrou no último dia 15. A Norte Energia começará a fazer estudos de caso referentes aos pedidos formulados pelos pescadores.
Em nota, a Norte Energia -cuja composição acionária é formada por Eletrobras, Petros, Funcef, Neoenergia, Vale, Sinobras, Light, Cemig e J. Malucelli Energia- afirmou que não há previsão nem exigência de plano de desmobilização de reservatório no âmbito do licenciamento ambiental do Brasil.
“No caso de uma paralisação da usina Belo Monte, diversas atividades seriam suspensas, como a execução de programas sociais e ambientais promovidos na região pela Norte Energia, o pagamento de royalties, o pagamento da dívida ao BNDES e a necessidade da substituição da geração de energia renovável e de baixo custo para o país”, cita a nota.
Cooperativas de pescadores se opõem a uma renovação automática da licença de operação, como consta em ofícios enviados ao Ibama. Trabalhadores do ramo de pesca ornamental no médio Xingu relataram ao órgão ambiental que o peixe amarelinho, bastante buscado para a finalidade ornamental, desapareceu do lago da usina.
“Não houve nem sequer um trabalho de sustentabilidade da atividade e reparação financeira dos danos causados a empresas e pescadores que trabalhavam com peixes ornamentais”, disseram associações e colônias de pescadores num ofício ao Ibama em abril.
Segundo a Norte Energia, o amarelinho não desapareceu, conforme resultados do monitoramento da ictiofauna feito pela UFPA (Universidade Federal do Pará). “O que ocorreu foi a flutuação da sua abundância, com diminuições nas capturas no reservatório principal do rio Xingu. Esta redução fora prevista no estudo de impactos ambientais da usina.”
Conforme a empresa, a categoria de pesca ornamental está incluída na lista de 1.976 pescadores a serem reparados financeiramente por falhas na mitigação de danos.
Sobre a licença de operação, a área técnica do Ibama diz que uma eventual suspensão levaria a uma desobrigação de o empreendimento executar projetos ambientais estabelecidos na autorização, assim como de cumprir condicionantes em curso, “gerando grave impacto negativo na região”.
Entre essas condições estão atividades de reassentamento da população atingida, assistência técnica, monitoramento da qualidade da água, transposição de embarcações para navegação e compromissos assumidos com populações indígenas da região.
Já o rebaixamento do nível de água de reservatórios, como consequência de uma eventual suspensão da licença, pode provocar alteração da qualidade da água, mortandade de peixes, ampliação de erosões, comprometimento da segurança de barragens e diques e impactos a comunidades ribeirinhas e indígenas, segundo o Ibama.
As licenças para Belo Monte foram viabilizadas no segundo mandato de Lula e nos governos de Dilma Rousseff (PT), quando ocorreram as obras. No primeiro ano de mandato, 2019, o governo Jair Bolsonaro (PL) concluiu as unidades geradoras e inaugurou o conjunto completo.
O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations.
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