O juiz Carlos Alberto Garcete, da 1ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande, expulsou o advogado Willer de Almeida de uma audiência de instrução depois que ele ofereceu um copo de água a uma testemunha.
O caso aconteceu no dia 19 de maio, em Campo Grande, mas só agora passou a repercutir nas redes sociais. A discussão teve início por causa do copo de vidro.
“Tira a água, que eu não autorizei”, intervém o juiz. “O senhor não está aqui para servir água para as pessoas. O senhor está aqui como advogado. O copo com vidro não é autorizado. A função do senhor não é servir água aqui.”
O magistrado então pede reforço policial para retirar o advogado da audiência, que foi suspensa após a confusão. “Isso é para você aprender que aqui existe juiz”, afirma o magistrado. “O juiz conduz a audiência e decide aqui. Quem desrespeita isso é retirado, não importa quem seja.”
Ao Estadão, o criminalista afirma que ofereceu água porque a mulher estava visivelmente emocionada. “Foi um ato de civilidade, de humanidade, que o próprio juiz não teve”, relembra.
O advogado, experiente nos Tribunais do Júri, diz que nunca passou por uma situação tão extrema: “Não vejo nada além do ego e da vaidade”.
Ele afirma ainda que se sentiu humilhado. “Meus colegas me conhecem por ser um advogado forte, mas tem o momento em você chega em casa e aquilo faz com que você desabe. O sentimento de ter sido humilhado, retirado de uma audiência, como se fosse um bandido, como tivesse cometido um crime, é uma sensação de uma humilhação muito forte”, relembra.
O caso foi parar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas entrou com uma reclamação disciplinar contra o juiz, por conduta desrespeitosa, humilhante e preconceituosa. A entidade afirma ainda que a reação do magistrado foi desproporcional e arbitrária.
“O juiz reclamado demonstrou comportamento completamente destoante do que se espera de uma autoridade que deveria ser imparcial, cordial e respeitosa”, critica a associação.
Professor de Direito Processual Penal, o juiz Carlos Alberto Garcete é autor de livros jurídicos e mantém um canal no YouTube sobre temas ligados ao Direito. Seus posicionamento, em geral, são garantistas. Ele já escreveu a favor do juiz de garantias e contra o magistrado determinar provas de ofício, por exemplo.
Em nota, a Associação de Magistrados de Mato Grosso do Sul (Amamsul) saiu em defesa do juiz. A entidade afirma o advogado tumultuou a audiência e que o magistrado usou legitimamente o poder de polícia.
“A conduta processual do juiz ateve-se aos exatos limites estabelecidos em lei para assegurar a ordem da audiência, tumultuada pela postura do advogado”, diz a nota. “O legítimo exercício do poder de polícia pelo magistrado, portanto, não pode ser confundido com abuso de autoridade.”
COM A PALAVRA, A ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS DE MATO GROSSO DO SUL
“É dever de todo e qualquer juiz, ao presidir audiência, manter a regularidade dos trabalhos, a disciplina e o decoro durante o curso do processo, evitando a prática de atos capazes de prejudicar a regular tramitação do feito. Esse poder de polícia encontra previsão legal no art. 794 do Código de Processo Penal, no art. 139, VII, do Código de Processo Civil e no art. 816 da Consolidação das Leis Trabalhistas, ganhando especial relevância em julgamentos de competência do Tribunal do Júri, considerando a singularidade desta espécie de procedimento, a teor do disposto no art. 497, I do Código de Processo Penal.
Nesse panorama, a conduta processual do juiz ateve-se aos exatos limites estabelecidos em lei para assegurar a ordem da audiência, tumultuada pela postura do advogado, a qual se revelou incondizente com os deveres que lhe são inerentes, justamente no momento da oitiva de testemunha, situação que poderia implicar em comprometimento do julgamento. O legítimo exercício do poder de polícia pelo magistrado, portanto, não pode ser confundido com abuso de autoridade.
A Associação dos Magistrados de Mato Grosso do Sul – AMAMSUL enfatiza o absoluto respeito às prerrogativas da advocacia, entretanto, esclarece que tais não podem ser utilizadas para corroborar posturas equivocadas dos profissionais, competindo aos magistrados, em audiência, velar pela disciplina do ato processual.”
COM A PALAVRA, O MAGISTRADO
A reportagem entrou em contato por e-mail com o juiz Carlos Alberto Garcete e aguarda resposta. O espaço está aberto para manifestação.
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