Líder de mercenários do Grupo Wagner ameaça deixar Bakhmut por falta de munição

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Cercado de cadáveres estendidos em um gramado, o fundador do grupo mercenário russo Wagner, Ievguêni Prigojin, usa uma lanterna para iluminar os corpos ensanguentados e ainda com farda na escuridão. “Estes são os rapazes que morreram hoje. O sangue ainda está fresco”, afirma, irritado.

Após se abster por semanas de críticas duras aos chefes da Defesa da Rússia, Prigojin voltou à artilharia com um vídeo perturbador e repleto de palavrões às autoridades de seu país.

“Temos 70% de falta de munição. Choigu! Gerasimov! Onde está a merda da munição?”, grita, referindo-se ao ministro da Defesa, Serguei Choigu, e ao chefe do Estado-Maior, Valeri Gerasimov. “Eles vieram aqui como voluntários e estão morrendo enquanto vocês engordam em seus gabinetes.”

Os responsáveis pelas mortes, disse Prigojin, vão para o inferno -as perdas da Wagner seriam cinco vezes menores se a empresa fosse abastecida adequadamente, segundo o russo.

As brigas entre o grupo e os chefes da Defesa começaram no ano passado, quando Prigojin começou a acusá-los de incompetência e de privação de munição por animosidades pessoais. A Wagner lidera há meses o ataque contra a cidade de Bakhmut, no leste da Ucrânia.

Nesta sexta-feira (5), porém, o chefe mercenário anunciou que suas forças deixarão a cidade ucraniana na próxima quarta-feira (10). Em uma carta endereçada também ao presidente russo Vladimir Putin, ele diz que está fazendo um apelo público porque seus pedidos não foram atendidos desde quando começou a relatar problemas, em março de 2022. “Estou retirando as unidades Wagner de Bakhmut porque, na ausência de munição, elas estão condenadas”, afirma.

A escassez de projéteis, sustenta o documento, é de 90%, e os recursos ofensivos acabaram no início de abril. A Wagner manteve o combate, argumenta Prigojin, mesmo enfrentando forças inimigas com cinco vezes mais aparatos. “Dos 45 km² de Bakhmut, restam 2,5 km². Ao não fornecer projéteis, vocês não estão nos privando da vitória, vocês estão privando o povo russo da vitória”, afirma. “Quem tiver críticas, venha a Bakhmut e levante-se com armas nas mãos no lugar de nossos camaradas mortos.”

Os últimos movimentos de diferentes atores da guerra corroboram a hipótese de falta de munição do lado russo –problema que também afeta a Ucrânia em uma proporção diferente, segundo especialistas.

Na última terça-feira (2), Choigu pediu à estatal Tactical Missiles Corporation para dobrar sua produção de mísseis para a guerra. “As ações das unidades russas que conduzem a operação especial dependem em grande parte do reabastecimento de estoques de armas, equipamentos militares e meios de destruição”, disse ele.

No mesmo dia, o Ministério da Defesa do Reino Unido engrossou tal avaliação ao dizer que os problemas logísticos são centrais e que Moscou não tem munição suficiente. “A Rússia continua dando a mais alta prioridade à mobilização de sua indústria de defesa, e ainda assim não consegue atender às demandas do tempo de guerra”, afirmou a pasta.

Em janeiro, os russos dispararam vários mísseis S-400, normalmente usados em defesa aérea de longo alcance, em Kiev. A estratégia gerou especulações de que a Rússia tenha um déficit considerável de mísseis de cruzeiro.

O próprio Putin criticou o ritmo de fabricação de armas do país. No início do ano, ele repreendeu um de seus ministros em comentários televisionados pelo fato de a produção de aeronaves levar “muito, muito tempo”. Em março, lamentou ainda a escassez de trabalhadores especializados na fabricação de itens de defesa. O ex-presidente Dmitri Medvedev, número 2 do Conselho de Segurança, foi mais longe e afirmou que os diretores de fábricas de armas poderiam ser responsabilizados criminalmente por não cumprirem os prazos de seus contratos com o Estado.

Também nesta sexta, a Rússia ordenou a saída de famílias com crianças e idosos no sul ucraniano ocupado pelos russos após um aumento de bombardeios do país rival.

“Nos últimos dias, o inimigo intensificou o bombardeio de assentamentos perto da linha de frente”, escreveu o chefe da região de Zaporíjia, Ievgeni Balitski, indicado pela Rússia, nas redes sociais. “Tomei, portanto, a decisão de evacuar primeiro todas as crianças e seus pais, idosos, pessoas com deficiência e pacientes hospitalares.” Os locais esvaziados incluem Enerhodar, cidade onde fica a maior usina nuclear da Europa e que agora está perto da linha de batalha.

Segundo a agência estatal russa Tass, houve ainda um incêndio em uma refinaria de petróleo no sudoeste da Rússia nesta sexta. O local, segundo os serviços de resgate locais, foi atacado com um drone no dia anterior. “Os trabalhadores da refinaria foram resgatados e ninguém ficou ferido”, afirmou a agência. O incêndio teria sido causado por um novo ataque de drones, estratégia usada em uma série de ofensivas denunciadas pelo Kremlim, incluindo uma suposta tentativa de assassinar Putin, na quarta-feira.

Sem apresentar evidências, Moscou despertou suspeitas de uma operação de “bandeira falsa” -quando um país simula um ataque contra si mesmo para iniciar uma guerra, retaliar rivais ou escalar uma situação. Após chamar a suposta ação de “ataque terrorista”, o ex-presidente Medvedev afirmou no Telegram que “não há mais opções, exceto a eliminação física de [Volodimir] Zelenski”, presidente ucraniano.

Durante o inverno europeu, a Ucrânia reforçou suas defesas antiaéreas, e agora Kiev está se preparando para lançar uma contraofensiva usando armas doadas por aliados. Em paralelo, milhares de soldados voltaram recentemente de uma série de treinamentos no Ocidente.

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