PUERTO IGUAZÚ, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou durante a cúpula de líderes do Mercosul que não está a par dos detalhes sobre a exclusão de candidatos opositores nas eleições da Venezuela e voltou a defender que haja diálogo com o regime de Nicolás Maduro, suspenso do grupo desde 2016.
“Em relação à Venezuela, todos os problemas que a gente tiver de democracia, a gente não se esconde, a gente enfrenta. Não conheço os pormenores dos problemas com os candidatos, mas pretendo conhecer”, disse Lula nesta terça (4), pouco depois que Uruguai e Paraguai cobraram uma posição do bloco sobre o regime.
Em discurso mais moderado do que nas últimas vezes em que falou sobre o assunto, Lula lembrou que esteve com o papa Francisco recentemente, no Vaticano -na ocasião, os dois falaram sobre a situação regional e sobre a Nicarágua, outra ditadura da vizinhança. Sobre a Venezuela, afirmou que, “no que a gente puder contribuir, dar um toque, temos que conversar”. “O que não pode é a gente isolar. E a gente tem que levar em conta que os defeitos não estão apenas de um lado, os defeitos são múltiplos.”
Os principais nomes da oposição venezuelana foram inabilitados a exercer cargos públicos na última sexta-feira (30) por decisão da Controladoria-Geral, o que na prática sepultou as perspectivas de eleições livres e democráticas que Maduro disse que faria em 2024.
María Corina Machado, hoje a principal opositora, ficou inelegível por 15 anos. Henrique Capriles, duas vezes candidato à Presidência, e Juan Guaidó, que chegou a ser reconhecido como presidente interino por mais de 50 países em 2019, incluindo o Brasil sob Jair Bolsonaro (PL), também não poderão disputar o pleito.
Lula também criticou os Estados Unidos e disse que já pediu a diversos presidentes americanos que conversassem com o regime, sem resultados, citando George W. Bush e Barack Obama. “Quantas vezes eu conversei com Bush: ‘toma iniciativa’. Não toma”, afirmou.
O petista tem ouvido conselhos de pessoas próximas nos últimos dias para deixar de comentar a situação política de Caracas, mas a tendência é que mantenha sua posição sobre o país vizinho. A avaliação de interlocutores é que a relação com a Venezuela virou a principal fonte de desgaste no terceiro mandato.
“O conceito de democracia é relativo para você e para mim. Gosto de democracia porque a democracia me fez chegar à Presidência pela terceira vez. Por isso gosto de democracia e a exerço na sua plenitude”, disse o petista na última quinta-feira (29), após ser questionado em entrevista acerca dos motivos pelos quais ele e seu governo hesitam em cravar que o regime de Maduro não é uma democracia.
Antes disso, o petista foi criticado por ter preparado uma recepção de gala para Maduro no Planalto, no fim de maio, quando recebeu líderes da América do Sul em Brasília e, um dia antes, teve uma agenda à parte com o venezuelano. Ambos deram entrevista juntos, e o petista afirmou que se tratava de um “momento histórico” que “reflete uma política externa séria”. “Cabe à Venezuela mostrar a sua narrativa para que possa fazer as pessoas mudarem de opinião. É preciso que você [Maduro] construa a sua narrativa. E a sua narrativa vai ser infinitamente melhor do que o que eles têm contado contra você.”
Lula também chegou a enviar seu assessor para política externa, o ex-chanceler Celso Amorim, a Caracas, em março. O diplomata teve encontros com oposicionistas e com o próprio Maduro no Palácio de Miraflores. De volta ao Brasil, disse ver “um incentivo inédito à democracia na Venezuela”.
O Mercosul é formado por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai e tem como associados os outros sete sul-americanos, exceto a Venezuela, suspensa há sete anos por violar a cláusula democrática do bloco. Já a Bolívia está desde 2012 em processo de adesão, que depende da aprovação do Legislativo brasileiro.
“Temos urgência para o acesso da Bolívia como membro pleno, e trabalharei pessoalmente por sua aprovação no Congresso”, afirmou Lula na cúpula, que contou com a presença e o discurso do presidente boliviano, Luis Arce. Depois de um hiato de 13 anos, o Brasil voltou a assumir a presidência do bloco.