Pai de estudante de medicina assassinado por PM divulga carta emocionante

O pai de Marco Aurélio Cardenas Acosta, estudante de Medicina de 22 anos, que foi morto com um tiro à queima-roupa disparado por um policial militar em São Paulo no dia 20 de novembro, publicou uma carta pública no último domingo, 5, pedindo por justiça e rapidez nas investigações sobre a morte do filho.

 

Em um texto compartilhado nas redes sociais, Julio Cesar Acosta Navarro criticou a demora nas investigações conduzidas pela Polícia Civil, destacando que, apesar da grande preocupação pública e da atenção da mídia, essa morosidade só contribui para a perpetuação da violência.

Marco Aurélio foi morto após um desentendimento com policiais, onde, segundo as câmeras de segurança, ele estava desarmado e sem camisa, correndo em direção a um hotel na Vila Mariana, na zona sul da cidade. Após uma breve luta corporal, um dos policiais disparou contra ele. O policial responsável pelo tiro foi indiciado por homicídio doloso, e os agentes envolvidos no incidente foram afastados das atividades ostensivas da PM.

Anteriormente, Navarro, professor da Faculdade de Medicina da USP, já havia solicitado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que o caso fosse tratado com urgência. Em resposta, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo afirmou que tomaria as providências legais e que não compactuaria com desvios de conduta, destacando que os responsáveis já haviam sido afastados e que o inquérito estava em andamento.

Leia a carta na íntegra:

Prezado cidadão, trabalhador, pai de família, intelectual permita-me ouvir as minhas palavras de angústia e desespero.

Na minha luta dolorosa pela “justiça dos homens” pelo assassinato do meu filho “Maicosillo” há 47 dias, quando o mundo ruiu para mim, recebi a solidariedade e a força de muita gente compassiva, onde ressalto a figura do Sr. Claudio Oliveira, ex-ouvidor da Polícia, demitido traiçoeira e absurdamente como “prêmio” a seu corajoso trabalho; também do Sr. Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, que teve a sensibilidade e temperança de assinar o Decreto contra o uso abusivo das armas por parte da polícia; assim como dos jornalistas que no ápice de sua ética e profissionalismo mostraram a realidade e não calaram das barbáries que podem se repetir no amanhã.

Também pude assistir à reação imediata contra o Decreto Presidencial, um freio contra a violência policial que assola o Brasil, de vários governadores de estado, como os de Goiás, Rio de Janeiro, Brasília, Minas Gerais, Paraná e ainda São Paulo. Resposta insensível, irracional e troglodita manifestado em um texto argumentando as razões em contra, com um pobre embasamento que qualquer estudante de colegial redigiria melhor em um final de semana. Sobre a “nota conjunta” destes governadores, na minha trajetória de professor e orientador de trabalhos acadêmicos, nunca vi uma asneira como essa.

Com muita dor pela lembrança do sofrimento do meu filho e muita raiva pela cretinice dos mecanismos do Estado operando, revisei linha por linha o relatório da Polícia Civil sobre o assassinato cruel do meu filho Marco Aurélio pelos Policiais Militares covardes Guilherme Augusto Macedo e Bruno Carvalho do Prado, ambos ainda andando soltos, recebendo seus salários e festejando as festas natalinas com uma cervejinha do lado, bem protegidos pelo Comandante da PM Cassio Araújo de Freitas e pelo Secretario da InSegurança Pública Guilherme Derrite, matador confesso orgulhosamente.

A primeira delegada da Polícia Civil, que vendo nas imagens do hotel a gravidade do crime, irresponsavelmente não considerou o crime hediondo como homicídio qualificado nem mandou prender em flagrante aos assassinos. O que levou a isso a essa delegada?… Ignorância, imperícia, medo ou maldade pura?

O boletim da Polícia Militar e sua versão demonstradamente falsa tentando desfigurar a imagem do meu filho, desde o início e sendo repetida em um esquema claramente aprendido com muito “tecnicismo” nas academias da Polícia Militar. Na maior evidência de cumplicidade e proteção aos criminosos na Polícia Civil, para retardar o processo de investigação, foram indicados sequencialmente não três ou quatro delegados em menos de 30 dias, foram oito delegados da Polícia Civil.

Um deles, o sétimo Delegado da Polícia Civil, apenas assumindo o caso e ciente da notoriedade e sofrimento de famílias, imediatamente informou no dia seguinte que entrava de férias até o final de ano; e ainda recomendou que o inquérito dos assassinos da Polícia Militar somente seja tomado após o retorno dele. Um verdadeiro circo. Sófocles e Aristófanes morreriam de inveja da criatividade das tragicomédias dos Delegados da Polícia Civil!

Demora vergonhosa das investigações pela Polícia Civil apesar da preocupação pública da sociedade e meios de comunicação, que resulta e promove mais crimes como aquele trabalhador lançado da ponte, o outro baleado com dez tiros pelas costas, os chutados na cabeça sem misericórdia, o inocente baleado por filmar com celular a violência policial de vários outros Policiais Militares.

Nossa Tarcísio, você falava sério quando desafiou ao mundo que podiam chamar “a ONU, a Liga da Justiça ou ao raio que o parta”. Quem vai parar a Polícia Militar de Tarcísio e o bufão Derrite? A turma de Marvel, os Justiceiros & Vigilantes, o Papa e os Anjos ou uma Revolução à Francesa?

Que pena de essas pobres famílias que há muitos anos têm sido humilhadas, burladas e pisoteadas nos seus direitos após de sofrer as maiores violências pela Polícia Militar, e às quais a minha família se juntou com lágrimas e sangue por um desígnio que Deus quis e do qual não sei se um dia entenderei. São Paulo não vai a caminho de ser um estado policial, ele já é um estado policial. Aqui quem manda é quem porta a arma mais potente em nome do Estado.

Pelo amor de Deus, me deixem chorar em paz a saudades do meu filho… Que mundo bizarro é esse que foi construído onde o inocente pobre é morto injustamente e tratado como um criminoso e os assassinos dele pagos pelo Estado são defendidos como heróis? Que o sacrifício do meu filho mais querido, o “Maicosillo”, sirva para evitar a dor e as lágrimas das famílias de outros filhos como um dia ele ainda adolescente uma vez sonhou.

Dr. Julio Cesar Acosta Navarro, PhD Professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

 

 

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