Panamá e Groenlândia rechaçam ameaças de Trump

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Panamá e Groenlândia reagiram duramente nesta quarta (5) à retomada da ameaça expansionista do presidente Donald Trump, que na véspera havia dito estar retomando o canal do país centro-americano e que tomaria a ilha ártica “de um jeito ou de outro”.

 

O premiê groenlandês, Mute Egede, rejeitou o assédio de Trump. Já o presidente panamenho, José Raúl Mulino, disse que é mentira equivaler a compra de portos na região por uma empresa americana à retomada do canal, e denunciou a fala do republicano como “uma afronta à dignidade da nação”.

“Nós não queremos ser americanos ou dinamarqueses, nós somos Kalaallit [o grupo étnico inuit da Groenlândia], escreveu no Facebook o premiê Egede. A ilha é um território autônomo do Reino da Dinamarca e está em negociações para tornar-se independente a partir de um pleito no dia 11.

Durante seu primeiro discurso ao Congresso nesse segundo mandato, Trump dirigiu-se ao povo groenlandês: “Nós apoiamos fortemente o direito de determinar o seu futuro, e se vocês escolherem, são bem-vindos aos EUA”.

Trump disse que “nós realmente precisamos dela para a segurança internacional”, disse, completando ao fim que a tomaria “de um jeito ou de outro”.

“Nós não estamos à venda e não podemos ser tomados. Nosso futuro é determinado por nós”, escreveu o premiê. O governo dinamarquês tem falado no mesmo tom desde que Trump começou a levantar a ideia, antes mesmo de assumir a Presidência. Nesta quarta, a chancelaria foi comedida, destacando que ele falou na autodeterminação dos locais.

No caso de Copenhague, há o agravante da atual animosidade entre a Casa Branca e a Europa, particularmente os sócios continentais da aliança militar Otan, da qual a Dinamarca faz parte.

EUA e aliados discordam sobre o rumo do apoio a Kiev na Guerra da Ucrânia, com Trump dando uma guinada em favor da visão de Vladimir Putin sobre o conflito e em choque direto com Volodimir Zelenski.

Além disso, o artigo 5 da carta de fundação da Otan prevê a defesa mútua em caso de agressão a um de seus membros. Ainda que tenha havido crises entre seus integrantes, particularmente Grécia e Turquia em torno de Chipre, nunca um aliado buscou tomar território de outro “de um jeito ou de outro”.

Houve risadas no plenário da Câmara dos Representantes quando Trump introduziu o tema, mas o assunto historicamente é levado a sério pelos EUA. O país tentou comprar a Groenlândia duas vezes na história, no fim do século 19 e em 1946, logo depois da Segunda Guerra Mundial.

Ao longo da Guerra Fria, a posição da ilha mostrou-se vital ao ambiente de segurança: ela estava na rota mais curta de mísseis com ogivas nucleares soviéticas em direção ao território americano, e vice-versa.

Assim, há até hoje no local a principal base de alerta antecipado por radar dos EUA, que rastreia lançamentos em todo o Hemisfério Norte e é responsável por soar o alarme em caso de um ataque nuclear ou convencional.

Além disso, e provavelmente mais importante na visão de negócios imposta por Trump à política externa americana, há o fato de que a mudança climática está derretendo as calotas de gelo da ilha, que tem um subsolo rico em minerais e potencial de exploração de petróleo e gás -obsessões do americano.

Pesquisas mostram que a maioria dos cerca de 56 mil groenlandeses são favoráveis à independência, mas contra ingressar nos EUA.

No seu discurso, Trump também voltou ao tema do canal do Panamá, obra feita pelos americanos assim como o próprio país -que foi extirpado da Colômbia em 1903 porque Bogotá não chegou a um acordo para ceder a ligação entre o golfo do México e o Pacífico que os franceses tentavam fazer aos EUA.

A obra foi concluída em 1914 e os americanos ganharam direito de operá-la por 99 anos, mas em 1977 foi acertada a devolução em 1999. Trump criticou Jimmy Carter, o presidente democrata que aprovou o acordo, morto no fim do ano passado.

“Minha administração está reclamando o canal do Panamá de volta”, disse, citando então um negócio privado como prova disso. O grupo americano BlackRock vai comprar o controle de portos nos extremos do canal da empresa de Hong Kong que os opera hoje por US$ 22,8 bilhões.

“O canal é panamenho e continuará a sê-lo”, disse nesta quarta o presidente do país, José Raúl Mulino. Segundo ele, a fala é uma “nova afronta à dignidade da nação”. A pressão americana, até aqui, já fez com que o Panamá deixasse a rede global de obras de infraestrutura da China.

O governo panamenho já havia dito que a transação é “privada e global”, e que como trata-se de uma concessão, o controle do canal segue com o país. Na versão de Trump, a China havia tomado conta do local, por onde passam 40% dos contêineres americanos.

Na fala do presidente americano, só faltou voltar ao tema da anexação do Canadá, mas por ora Trump está fixado na inclusão do vizinho, além do México e da China, em sua guerra tarifária.

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