SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um mês depois de dizer que “Deus odeia o orgulho”, inaugurando uma ruidosa campanha anti-LGBTQIA+ na igreja onde prega em Orlando (EUA), o pastor André Valadão disse que é preciso “resetar” os membros dessa comunidade e que, se Deus pudesse, “matava tudo e começava tudo de novo”.
A fala apareceu em culto neste fim de semana. Primeiro Valadão ironiza: “O que vale é toda forma de amor, deixa casar, deixa viver”. Aí os fiéis se horrorizam quando homens e mulheres dançam na frente de crianças com genitálias expostas em paradas que enaltecem o respeito à diversidade sexual, afirma na sequência.
É quando diz: “Então agora é a hora de tomar as cordas de volta e dizer ‘nananinanão’, ‘pó’ parar, reseta. Aí Deus fala: não posso mais, já meti esse arco-íris aí. Se eu pudesse, matava tudo e começava tudo de novo. Mas já prometi a mim mesmo que não posso, então agora tá com vocês”.
Valadão disse à reportagem que sua declaração foi tirada de contexto e enviou o link de um vídeo que compartilhou nesta segunda (3). Na peça, ele culpa “a grande mídia” pela repercussão do culto.
“Pelo amor de deus, gente, não digo [para] nós aniquilarmos pessoas. Digo que cabe a nós levar o ser humano ao princípio daquela que é a vontade de Deus”, diz ali. Usa Gênesis, o primeiro dos livros bíblicos, para justificar a parte em que cita uma matança generalizada de pessoas da comunidade LGBTQIA+.
Lá está o dilúvio que Deus teria armado para fulminar a humanidade, à exceção de Noé, o construtor da arca, e sua família. A providência divina destruiu a todos “por causa da libertinagem, daquilo que um cristão genuíno considera contrário à vontade de Deus”, afirma Valadão.
Na legenda do post, o líder evangélico diz que “nunca será sobre matar, segregar, mas será, sim, sobre resetar, levar de volta à essência, ao princípio”.
O discurso de Valadão levou Fabiano Contarato (PT-ES), primeiro senador abertamente gay do Brasil, a dizer que entrará com uma representação criminal contra o pastor, a quem acusa de manipular a fé e incitar a violência. “Por tudo que sou, pelo que acredito, pela minha família e por tudo que espero para a sociedade, não posso me calar diante do crime praticado por André Valadão”, diz Contarato.
André Valadão assumiu no fim de 2022 a liderança da Lagoinha Global, com mais de 700 templos no Brasil e no mundo. Subiu na hierarquia após seu pai, o pastor Márcio Valadão, nome respeitado no meio, se aposentar.
Ele se afastou após anunciar a morte por infarto do ex-ator Guilherme de Pádua, assassino de Daniella Perez que virou pastor da igreja, num vídeo peculiar. “Caiu e morreu. Morreu agora, agorinha”, informou sorrindo. O tom insólito levantou suspeitas sobre senilidade e abriu espaço para o filho.
Ainda que a matriz da Lagoinha, em Belo Horizonte, esteja a cargo de outro pastor, Flavinho, André Valadão conquistou poder após a saída do patriarca. Ele já vinha cumprindo o papel mais midiático da família nos últimos anos. Em 2022, foi um dos apoiadores evangélicos mais entusiasmados de Jair Bolsonaro (PL).
“O André, desde a sua juventude, despertava polêmicas”, diz o pastor Bob Luiz Botelho, membro-associado das Nações Unidas para assuntos religiosos e fundador do Evangélicxs Pela Diversidade.
“Ele sempre pregou discursos que padronizam a fé, essa postura de dizer que para você chegar numa espiritualidade X, precisa fazer o caminho A, não existe B ou C. Tem sempre que ser do jeito que ele quer, um garoto mimado que se recusa a fazer um estudo sério sobre qualquer tema. Um verdadeiro coach que nada tem a ver com o evangelho plural de Jesus.”