SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em meio ao grave recrudescimento da violência causada por gangues no Haiti, policiais se juntaram a manifestantes em grandes atos nesta quinta-feira (26). Em protesto contra o assassinato de ao menos seis agentes em uma delegacia de Liancourt atacada por criminosos, os grupos levaram a um dia de caos na capital do país.
Vias importantes de Porto Príncipe foram bloqueadas com barricadas, o aeroporto Toussaint Louverture, o principal do país, teve a pista invadida, interrompendo o tráfego de aviões. Manifestantes à paisana, que se identificaram como policiais, chegaram ao terminal depois de terem atacado a residência oficial do primeiro-ministro, segundo uma testemunha relatou à agência de notícias Reuters.
Ariel Henry não estava no local, mas voltou nesta quinta ao Haiti, após uma viagem à Argentina, na qual participou da cúpula da Celac. O político ficou temporariamente sem conseguir sair do aeroporto, mas ao fim pôde retornar para casa -não sem ser seguido por manifestantes. Uma pessoa presente no momento disse à Reuters ter ouvido uma série de disparos perto da residência oficial.
A Polícia Nacional do Haiti e o gabinete do primeiro-ministro não responderam a pedidos de comentários.
Um vídeo filmado pela imprensa local mostrou um grupo de homens, alguns deles vestindo camisas com a inscrição “polícia”, discutindo acaloradamente com agentes uniformizados no aeroporto. Na sequência das imagens, eles parecem passar sem qualquer resistência.
Estradas ao redor de Porto Príncipe e em várias cidades do país, especialmente na região norte, também sofreram bloqueios.
O grupo haitiano de direitos humanos RNDDH disse em comunicado que 78 policiais foram mortos desde que Henry chegou ao poder, em julho de 2021 -o premiê assumiu após o assassinato do então presidente, Jovenel Moïse. Para a ONG, o político e o chefe da Polícia Nacional, Frantz Elbe, são “responsáveis por cada uma das vidas perdidas”, na média de cinco por mês.
“A história vai lembrar que eles não fizeram nada para proteger e preservar a vida desses agentes que escolheram servir ao seu país”, diz o texto, que pede à polícia que se lembre de seu dever de proteger o povo haitiano, “apesar de suas frustrações”.
Desde o começo do ano, 14 agentes foram mortos por membros de gangues, segundo o sindicato das forças de segurança. Só na semana passada houve dois casos de repercussão. Em um, o grupo Vitelhomme assassinou quatro policiais. Outro foi o da delegacia de Liancourt, onde criminosos do grupo Savien mataram dois agentes e renderam outros quatro, depois levados para um campo e executados, de acordo com o relato do delegado Jean-Bruce Myrtil.
O Haiti, país mais pobre das Américas, vive uma espiral de crises ininterruptas, que se acumulam em camadas sociais, políticas, econômicas e humanitárias. A ação de gangues, que na prática detêm o controle de boa parte do território, está ligada a boa parte dessas questões.
Em 2022, a ONU registrou 1.359 sequestros no país -ações usadas por esses criminosos como forma de financiamento- e mais de 2.000 assassinatos. A entidade avalia o envio de uma força colegiada estrangeira para enfrentar as gangues, mas até aqui nenhum país se ofereceu para liderar a missão, e mesmo no Haiti houve manifestações de oposição à ideia -em parte devido à experiência, mal sucedida em muitos pontos, da chamada Minustah.