BRUNA VIESSERI
PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – Sete funcionários da rede de petshop Cobasi foram indiciados, nesta quarta-feira (12), pela morte de animais deixados dentro das lojas durante a inundação que atingiu Porto Alegre. As duas unidades gaĂşchas e a matriz, em SĂŁo Paulo, tambĂ©m foram indiciadas, por meio dos CNPJs.
O indiciamento ocorre dentro da Lei de Crimes Ambientais, que prevĂŞ penalização a quem comete maus-tratos e causa experiĂŞncias de dor e sofrimento a animais. A pena estipula detenção de trĂŞs meses a um ano, e multa. A sanção aumenta em caso de morte dos bichos e há agravante previsto para crimes praticados em Ă©poca de inundações. A Cobasi aponta “indignação” com o indiciamento e diz que funcionários tomaram providĂŞncias para garantir que os animais estivessem em altura segura.
– Abrigos de animais no RS sofrem com queda de voluntários, doença e exaustĂŁo
A polĂcia estima que quase 200 animais que estavam Ă venda tenham morrido, incluindo aves, roedores e peixes. Na loja situada no subsolo do shopping Praia de Belas, na área central de Porto Alegre, foram recolhidas 38 carcaças, mas a lista do estoque da unidade indica que havia 175 animais no local, que ficou submerso.
A outra loja da Cobasi fica na avenida Brasil, no bairro SĂŁo Geraldo. Ali, ao menos uma ave e peixes foram encontrados mortos. Um grupo de aves e peixes foi retirado com vida, mas a empresa nĂŁo divulgou quantos.
A delegada Samieh Saleh, que investiga o caso, disse que a Cobasi nĂŁo tinha plano de contingĂŞncia para proteger os animais e tambĂ©m nĂŁo se mobilizou para resgatá-los apĂłs o inĂcio da inundação.
“Fica demonstrado um total despreparo de uma rede que lida com animais vivos, que se propõe a promover seu bem-estar. NĂŁo souberam lidar com a situação, nĂŁo prestaram o suporte necessário diante dos alertas sobre a enchente. TambĂ©m nĂŁo buscaram formas de retirar os animais das lojas depois do alagamento”, disse a titular da Dema (Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente), que integra o Deic (Departamento Estadual de Investigações Criminais) do estado.
A morte dos bichos na loja do shopping foi descoberta depois que a ONG PrincĂpio Animal conseguiu autorização na Justiça para ingressar no local. A liminar foi obtida em 18 de maio, e a unidade havia sido evacuada por funcionários no dia 3.
“Os animais passaram por um cenário de horror nestes dias. A coloração e o cheiro da água ali dentro eram de esgoto, ficou impregnado na equipe mesmo depois de sairmos dali”, diz a delegada.
Em depoimento, os gerentes das lojas gaĂşchas afirmaram que deixaram comida e água em maior quantidade aos animais, antes da evacuação, medida que nĂŁo Ă© suficiente para a sobrevivĂŞncia, segundo a polĂcia.
Por outro lado, ainda conforme a polĂcia, equipamentos eletrĂ´nicos foram remanejados por funcionários da loja do shopping. Ao menos quatro computadores foram levados ao mezanino, e localizados pela delegada no local mais alto, longe da parte que ficou submersa.
Conforme a polĂcia, integrantes do escritĂłrio da Cobasi em SĂŁo Paulo sabiam que os animais permaneciam dentro das lojas em Porto Alegre e nĂŁo orientaram pelo resgate.
Em depoimento Ă polĂcia, um responsável pela direção do shopping afirmou que procurou uma das gerentes da loja apĂłs o inĂcio do alagamento e ofereceu acesso Ă unidade, para verificar como estariam os animais. A funcionária, no entanto, nĂŁo teria mobilizado equipes para o resgate, segundo a testemunha.
OUTRO LADO
O advogado da empresa, Paulo da Cunha Bueno, disse que a Cobasi vĂŞ com “completa indignação” o indiciamento de seus colaboradores, avaliado por ele como “contorcionismo jurĂdico”, que resultou em “conclusões levianas.”
“A equipe da loja localizada no shopping Praia de Belas, assim como toda a população e
autoridades do RS, foi surpreendida por um evento da natureza de proporções imponderáveis, estado de coisas que, por si sĂł, já tornaria incogitável que a causa da morte dos animais da loja possa ser distorcida para uma acusação de crime que demandaria, inclusive, requintes de crueldade em sua configuração.”
Por meio de nota, a Cobasi informou que nĂŁo havia indicação da “magnitude do desastre” que atingiu o estado e que “os colaboradores tomaram todas as providĂŞncias para garantir que as aves, pequenos roedores e peixes estivessem em altura segura”.
A empresa afirma que os animais foram colocados em estruturas acima de 1 m de altura, mas que a água chegou a 3,5 m, atingindo o teto da loja.
A empresa diz que a gerência do shopping, onde fica umas das lojas afetadas, solicitou que lojistas não tentassem acessar o local. Apesar disso, uma das gerentes teria ido ao local e sido impedida por seguranças de acessar o shopping.
Segundo a empresa, informações recebidas pela gerente indicavam que a loja não correria risco de inundação.
Em relação aos computadores, a gerĂŞncia da loja diz que apenas quatro CPUs foram removidas, porque ficavam prĂłximas do chĂŁo, nos caixas, e que nĂŁo sabe o motivo de terem sido levados ao mezanino, “sendo que essas CPUs sĂŁo equipamentos eletrĂ´nicos de menor importância em relação a todos os outros que permaneceram no salĂŁo inundado”.
“A gerĂŞncia da loja manteve-se sempre em contato com a direção do shopping sendo informada, em todas as oportunidades, de que a situação estava controlada e que, a despeito disso, os acessos Ă s suas dependĂŞncias nĂŁo estavam autorizados por razĂŁo de segurança. A Cobasi lamenta profundamente o ocorrido”, diz a empresa.
OUTRO INDICIAMENTO
Dois responsáveis pelo petshop Bicharada, de Porto Alegre, também foram indiciados por crime ambiental no mesmo inquérito, assim como a própria empresa. Animais que estavam à venda também foram deixados para trás quando a loja, na avenida Júlio de Castilhos, foi alagada.
Em 15 de maio, um grupo de voluntários, incluindo integrantes da ONG, acessou o estabelecimento, que estava fechado, pelo telhado, após receber denúncias.
Conforme a polĂcia, quatro aves e diversos peixes morreram na unidade. Com vida, foram resgatados 41 aves, 11 ratos, 8 hamsters e uma chinchila. O inquĂ©rito policial aponta que esses animais estavam em más condições de higiene, “debilitados” e “visivelmente sem cuidado de manejo há dias”. Todos foram levados para atendimento veterinário.
Em depoimento Ă polĂcia, os responsáveis pela loja alegaram que já vinham resgatando os animais aos poucos. Eles nĂŁo souberam informar quantos bichos no total estavam no estabelecimento, segundo a delegada.
Alexandre Scottá, um dos responsáveis pela loja, disse que os animais não foram abandonados no local.
“Como a gente nĂŁo conseguia barco para retirar os animais, estávamos indo no local a cada dois ou trĂŞs dias, para alimentá-los. Eu já havia conseguido resgatar algumas aves quando a ONG esteve na loja. PegarĂamos os demais nos dias seguintes. Inclusive resgatei dois gatos e um cĂŁo que estavam lá logo nos primeiros dias apĂłs a inundação”, disse.
O empresário diz ainda que não localizou nenhum animal morto na loja, apesar de o inquérito policial indicar que foram retirados aves e peixes sem vida.
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