Recusa vacinal e desmatamento podem explicar alta da febre amarela

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Brasil registrou quatro mortes e oito casos de febre amarela apenas no primeiro mês de 2025, todos no estado de São Paulo. Em todo o ano passado, foram nove infecções e três óbitos no país. Para especialistas, a recusa à vacina e o avanço da urbanização em áreas de mata podem estar por trás desse aumento.

 

A doença possui dois ciclos de transmissão e infecta tanto humanos quanto macacos. No ambiente silvestre, a transmissão ocorre por mosquitos dos gêneros Haemagogus e Sabethes. Já nas áreas urbanas, pode ocorrer por meio do Aedes aegypti, mas, os últimos casos de febre amarela urbana no país foram registrados em 1942.

Segundo Regiane de Paula, coordenadora de controle de doenças da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, as vítimas fatais não estavam vacinadas e haviam visitado áreas de mata, onde possivelmente entraram em contato com o mosquito transmissor. A vacina é a principal prevenção contra a doença.

Além da falta de vacinação, o desmatamento, o avanço da urbanização em áreas de mata, as queimadas e as mudanças climáticas aumentam o contato entre humanos e mosquitos silvestres, segundo a bióloga e pesquisadora da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), Márcia Chame.

“A fumaça e os incêndios provocam o deslocamento dos mosquitos silvestres e eles vão encontrar o sangue dos humanos nos fragmentos florestais [pequenas áreas de mata que sobraram após o desmatamento, ficando isoladas em meio a cidades ou plantações]”, diz.

Os próprios macacos passam a ocupar mais ambientes urbanizados, transitando entre áreas silvestres e urbanas, o que facilita a transmissão da doença entre mosquitos e humanos. Vale destacar que esses animais não transmitem diretamente a febre amarela; são apenas hospedeiros do vírus.

Na semana entre o Natal e o Ano Novo, em 2024, a unidade da USP (Universidade de São Paulo) em Ribeirão Preto encontrou em seu campus quatro macacos bugio mortos que receberam laudo positivo para febre amarela. “O macaco é tão vítima quanto os humanos. E eles são nossos melhores sentinelas, pois a presença de macacos mortos ou doentes indica a circulação do vírus na região”, diz Chame.

Diante das mudanças climáticas e da ação humana, a especialista cita como exemplos de áreas propícias à transmissão locais antes florestais que foram desmatados para construção de condomínios. Além disso, cidades como o Rio de Janeiro e até mesmo alguns campi universitários, como em Ribeirão Preto, possuem áreas florestadas que podem favorecer a presença do mosquito vetor.

A bióloga, que também coordena o Sistema de Informação em Saúde Silvestre da Fiocruz, destaca que, até o momento, não há registros de infecção por febre amarela em mosquitos Aedes aegypti. Caso isso acontecesse, o potencial de disseminação da doença seria maior, já que esse inseto prefere sangue humano e vive em áreas urbanas. “Pode ser que isso ocorra no futuro, mas, por enquanto, não há evidências.”

Apesar disso, o infectologista, epidemiologista e professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP (Universidade de São Paulo), Fernando Bellissimo, diz que não há registro de epidemia de febre amarela urbana desde 1942, mas que não é possível saber com certeza qual foi o mosquito transmissor.

“A gente torce para o Aedes aegypti não estar contaminado, porque isso cria a possibilidade de transmissão homem a homem, sem depender do macaco, que é o que a gente chama de febre amarela urbana. Isso até o momento não foi realmente detectado, mas é possível que esteja acontecendo em um nível subliminar”, argumenta.

Vacina é a principal prevenção

A febre amarela está em seu período sazonal, de dezembro a maio, quando o calor e as chuvas favorecem o aumento da população de mosquitos e a replicação do vírus nesses insetos, aponta Chame.

“As mudanças climáticas elevam as temperaturas, aumentam a pluviosidade e provocam secas prolongadas e chuvas intensas. Normalmente, períodos frios mais longos reduzem as populações de mosquitos, mas temos registrado menos frio, e quando ocorre, dura apenas alguns dias, em vez de meses”, afirma Márcia Chame.

De acordo com informações do Ministério da Saúde, a febre amarela tem evolução abrupta e gravidade variável, com elevada letalidade nas suas formas graves. Dentre os principais sintomas da doença estão febre súbita, calafrios, dor de cabeça, dor nas costas e no corpo, náusea e vômitos, fadiga e fraqueza.

A vacina contra a doença está disponível em UBSs (Unidades Básicas de Saúde) e faz parte do calendário de vacinação. O imunizante deve ser aplicado em duas doses para crianças menores de 5 anos, e em dose única para os demais.

“Se você não fez a vacinação em nenhum momento, deve procurar uma unidade de saúde para tomar uma dose da vacina. Se não tiver a imunização e for para áreas de risco, locais que tenham circulação do vírus, deve-se imunizar dez dias antes”, explica Regiane de Paula.

O projeto Saúde Pública tem apoio da Umane, associação civil que tem como objetivo auxiliar iniciativas voltadas à promoção da saúde.

 

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