SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Justiça da Nicarágua, que vive uma ditadura sob o comando de Daniel Ortega, cassou indefinidamente os direitos políticos de 14 presos do país, segundo denúncia do Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh), medida classificada pela organização de “aberração jurídica”.
A sentença, emitida pela juíza Nadia Tardencilla, proíbe os alvos da decisão, por toda a vida, de concorrer em quaisquer eleições ou de exercer cargos públicos.
A punição, de acordo com o Código Penal do país, seria acessória -categoria que não pode ultrapassar a duração da pena principal. Segundo o Cenidh, os 14 atingidos foram condenados por conspiração contra a integridade nacional e suposta divulgação de notícias falsas, delitos que têm penas de cinco anos cada e resultaram em dez anos de prisão.
“Para o Cenidh isso é uma afronta ao direito, à inteligência, à comunidade internacional e aos organismos internacionais de direitos humanos”, afirma o grupo em nota. “Denunciamos ao mundo essa barbárie jurídica, essa perseguição indiscriminada que destrói não só a institucionalidade, mas também qualquer vestígio de segurança jurídica que havia no país. É o aniquilamento dos presos políticos, de quem exigimos a liberdade imediata.”
Entre os condenados estão os sacerdotes Ramiro Tijerino, Sadiel Eugarrios, José Luis Diaz e Raúl Vegas, os seminaristas Darvin Leiva e Melkin Centeno e o cinegrafista Sergio Cárdenas. Todo o processo judicial é criticado pelo grupo de direitos humanos e pela mídia independente que ainda resiste à repressão imposta pela ditadura.
Nos últimos anos, Ortega passou a dominar o Legislativo do país e avançou sobre o Judiciário, nomeando novos juízes da Suprema Corte para viabilizar a aprovação de leis que correspondem a seus interesses, como a que estende a duração das prisões preventivas.
Sabem-se poucos detalhes da audiência que resultou na retirada de direitos políticos. Ela foi realizada no último dia 3 a portas fechadas, segundo o jornal nicaraguense Confidencial. De acordo com fontes anônimas da publicação, os sacerdotes e o cinegrafista afirmaram ser inocentes durante o julgamento e leram versículos da Bíblia.
Existem 245 opositores presos no país, que se autocratizou após as manifestações contra a reforma da Previdência proposta pelo regime de Ortega em 2018. Durante os protestos, ao menos 355 foram mortas, de acordo com a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).
O ditador nicaraguense promove uma cruzada contra a Igreja Católica em seu país. Durante os protestos de 2018, a Conferência Episcopal, então mediadora entre regime e oposição, considerou as mortes uma agressão sistemática e organizada e anunciou que não voltaria à mesa de diálogo para dar fim à crise enquanto a população continuasse sendo “reprimida e assassinada”. Pelo menos sete líderes religiosos foram presos pelo regime apenas neste ano.
Ortega foi um dos líderes da Revolução Sandinista que derrubou a ditadura dos Somoza e participou da primeira junta que liderou o país após a queda da dinastia, entre entre 1979 e 1990, quando saiu pacificamente do poder. Ele voltou à Presidência em 2007 e desde então tenta inviabilizar a oposição . Nas eleições de 2021, quando foi reconduzido ao cargo pela quarta vez consecutiva, os sete postulantes de oposição estavam presos, acusados de lavagem de dinheiro e traição à pátria.