Resgate de pessoas em situação análoga à escravidão no RS dispara em 3 anos

SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) – Após uma queda no número de resgates de trabalhadores em situação análoga à escravidão entre 2013 e 2020, o estado do Rio Grande do Sul viu disparar o número de pessoas libertadas pelo poder público nessas condições desde 2021.

Os dados de escravidão moderna, como a situação também é chamada, são do MPT (Ministério Público do Trabalho) do RS e foram repassados com exclusividade ao UOL.

O recorde foi registrado no dia 22 de fevereiro, em Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, com a libertação de 207 pessoas. Até o momento, 208 trabalhadores em condição análoga à escravidão foram resgatados no estado este ano.

Procurada, a Secretaria Estadual de Trabalho do Rio Grande do Sul não comentou o aumento de resgates ao afirmar que “fiscalização de condições de trabalho é responsabilidade federal”. Procurado, o Ministério do Trabalho não quis comentar.

Em fevereiro deste ano os resgates foram em fazendas que prestavam serviços para as vinícolas Aurora, Cooperativa Garibaldi e Salton. No ano passado, a maior ação de resgate no Rio Grande do Sul ocorreu em abril, quando 80 homens foram salvos depois de aliciados na Bahia, Paraíba e Maranhão para trabalharem na colheita da maçã em Bom Jesus, a 245 km da capital.

Em março de 2021, 18 trabalhadores foram encontrados em situação semelhante em uma fábrica clandestina de cigarros na cidade de Triunfo, Região Metropolitana de Porto Alegre. Eles estavam confinados em um bunker subterrâneo, segundo o MPT.

RESGATES DE PESSOAS EM TRABALHO ANÁLOGO À ESCRAVIDÃO NO RS

2023: 208 resgates (até 3/3/2023)
2022: 156
2021: 76
2020: 5
2019: 2
2018: 0
2017: 6
2016: 17
2015: 32
2014: 1
2013: 44

O PERFIL DOS TRABALHADORES

Nove a cada 10 resgatados em escravidão contemporânea no Rio Grande do Sul são homens, mais de um terço têm de 18 a 24 anos e 74% são pretos e pardos, segundo perfil traçado pelo Ministério do Trabalho e Emprego.
– 22% dos resgatados estudaram até o 5º ano.
– 19% têm até o ensino fundamental.
– 3% eram analfabetos.

FALTA FISCALIZAÇÃO

“Um fator que contribui para aumento de casos de trabalho em condições análogas à de escravo é a redução das fiscalizações de rotina”, afirmou à reportagem o procurador Italvar Medina, coordenador nacional da Conaete (Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas).

Não é feito concurso público desde o ano de 2013 e há mais de 1500 cargos vagos, o que representa quase 50% do total de cargos.

Italvar Medina, procurador

Embora o Ministério do Trabalho não comente o aumento de resgates no Rio Grande do Sul, ele confirmou que o quadro de fiscais caiu de 2.496, em 2016 -último dado disponível-, para 1.952 em 2022.

Medina também atribui o aumento de resgates “aos índices de pobreza resultado tanto do agravamento da situação econômica do país, quanto dos efeitos da pandemia de covid-19”.

“As vítimas são pessoas que não tiveram acesso à educação de qualidade – a maioria não tem nem sequer o ensino primário completo”, afirma, e “já foram anteriormente vitimadas por trabalho infantil”.

“Quando a situação econômica se agrava, aumentam as chances de essas pessoas (…) serem aliciadas para trabalho em locais distantes mediante falsas promessas de ótimas condições de trabalho e remuneração. Chegando lá, descobrem que a situação não é como a prometida”, diz o procurador.

Em nota, o governo estadual disse que, desde o resgate de trabalhadores nas vinícolas, foi criado “um grupo de trabalho com diferentes secretarias para acompanhar as ações”. Ele participa de uma força-tarefa para erradicação desse tipo de exploração pôs à disposição dos resgatados “todos os serviços para reinserção no mercado de trabalho, bem como realização de qualificações e capacitações”.

Segundo o Ministério do Trabalho, Minas Gerais foi o estado com mais resgates em 2022: 1070. A principal ação ocorreu na cidade mineira de Varjão de Minas, quando 273 trabalhadores eram explorados em atividade de corte de cana-de-açúcar.

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