Salvador, Rio e outras sete capitais perdem moradores entre 2010 e 2022

(FOLHAPRESS) – Nove das 27 capitais brasileiras tiveram queda no número de habitantes entre os anos de 2010 e 2022, apontam dados do Censo 2022 divulgados nesta quarta-feira (27) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

A maior redução aconteceu em Salvador, cidade cuja população saiu de 2.675.656 habitantes, em 2010, para 2.418.005, em 2022, queda de 9,6%. Com isso, a capital baiana foi superada por Brasília e Fortaleza e caiu de terceira para quinta maior cidade do país.

Também perderam moradores capitais como Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Porto Alegre, Belém e Natal. Em números absolutos, o Rio teve a segunda maior redução, com menos 109.023 habitantes -uma queda de 1,7%.

A terceira cidade que mais perdeu moradores não é capital e está na região metropolitana fluminense: São Gonçalo (RJ) saiu de uma população de 999.728 para 896.744 e foi o município que proporcionalmente teve a maior redução dentre aqueles com mais de 100 mil habitantes.

“Os municípios núcleos das concentrações urbanas, especialmente aquelas metropolitanas, estão perdendo dinâmica ou crescendo muito pouquinho, ou mesmo diminuindo a população. No Brasil, isso é um fato novo”, explica Cláudio Stenner, diretor de Geociências do IBGE.

Em parte dos casos, a queda é resultado do esgotamento territorial do município. Salvador, por exemplo, tem o mapa em formato de um triângulo invertido e é cercada pelo mar a leste e oeste. O avanço urbanístico nas últimas décadas aconteceu em direção ao norte.

Com pouca opção de novos terrenos disponíveis e o encarecimento dos preços dos imóveis, parte dos moradores optou por viver nas cidades do entorno da capital baiana. Não por acaso, a queda da população de Salvador veio acompanhada de um crescimento dos municípios vizinhos.

Em Lauro de Freitas, por exemplo, a população cresceu de 163.449 para 203.334 moradores entre 2010 e 2022. Movimento similar aconteceu em Camaçari, cidade industrial no entorno de Salvador, que cresceu de 242.970 para 299.579 habitantes nos últimos 12 anos.

Em geral, moradores que migraram para cidades próximas à capital baiana foram em busca de imóveis mais baratos e uma melhor qualidade de vida.

Iolanda Castanheira, 61, morava em um apartamento no bairro da Pituba, área central de Salvador. Mudou-se no ano passado com o marido para uma casa na vila de Abrantes, distrito que fica nas proximidades do litoral de Camaçari, a cerca de 15km da saída da capital.

“Queria sair da bagunça da cidade grande”, explica Iolanda. Ela já planejava trocar o apartamento por uma casa, mas se deparou com preços altos dos imóveis dentro de Salvador. Buscou um terreno em Abrantes e construiu seu próprio espaço, com quintal e churrasqueira.

Os planos dos filhos Samuel, 36, e Jaime Castanheira, 40 também impactaram a decisão de Iolanda. Ambos já haviam comprado terrenos em Abrantes, começaram a construir suas respectivas casas e também devem deixar Salvador no próximo ano.

Cidades médias do interior da Bahia também tiveram crescimento populacional, caso de Vitória da Conquista. A cidade do sudoeste baiano saiu de 306.866 moradores em 2010 para 370.868 no ano passado, um acréscimo superior a 20%.

Além do movimento rumo ao interior e a cidades vizinhas, há uma migração de Salvador para outros estados. O ator e músico Roquildes Junior, 36, também deixou a capital baiana em setembro de 2021 após ser aprovado em uma audição para um musical em São Paulo.

“Há uma certa romantização desse processo de êxodo, mas para mim foi uma questão circunstancial. Nada impede que um projeto me leve de volta para Salvador “, afirma Roquildes, que divide um apartamento com outros dois amigos baianos.

Na avaliação de Ulisses Fernandes, do Instituto de Geografia da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), a migração de grandes centros urbanos se deve, de forma geral, a duas causas: a saturação das metrópoles e a busca por melhores serviços e oportunidades de trabalho.

“As pessoas começaram a sair dessas grandes áreas concentradas porque elas ficaram caras e estão sobrecarregadas, principalmente quando se trata de questões como serviços, mobilidade e saúde”, afirma o professor, que diz ver esse movimento da migração a partir de cidades como o Rio de Janeiro.

Dados do IBGE mostram que cidades como São Gonçalo, Nilópolis e a própria capital fluminense perderam habitantes, enquanto houve um aumento da população na região dos Lagos e da baixada litorânea fluminense, que vai de Maricá até Campos dos Goytacazes

Para Ulisses Fernandes, isso se deve a uma nova lógica ditada pelos negócios do petróleo e que também é vinculada a uma crescente atração do turismo e da segunda residência: “Isso gera serviço e aumenta o comércio. Dá um novo dinamismo a essas áreas”, diz o professor.

Maricá é uma das cidades que mais cresceu proporcionalmente. Ela foi de uma população de 127.461, em 2010, para 197.300. Um aumento de 54,8%. Da mesma forma, Rio das Ostras também teve um aumento relevante, de 48,1%, saindo de 105.676 para 156.491 habitantes.

O avanço das tecnologias e a pandemia da Covid-19 também tiveram um papel importante para que acontecesse esse fluxo migratório, aponta a professora Tamara Egler, do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro)

“O processo de urbanização clássica é produto da industrialização, mas quando você pensa na revolução digital, é uma outra base. A tecnologia produz novas formas de comunicação e de trabalho”, afirma.

A saída de grandes aglomerados urbanos tem sido chamada por especialistas de “desmetropolização”. A publicitária Laura Toledo fez este caminho e trocou, em 2017, a capital do Rio por Lumiar, distrito da cidade de Nova Friburgo.

Os principais motivos da mudança foram a violência e a busca por um local mais tranquilo para que pudesse ampliar a família: “Saí pensando em uma mudança de vida, com a ideia de engravidar e ter a certeza de que meu filho não cresceria em uma cidade como o Rio”.

Mauro Santa Cecília deixou o Rio para morar em Xerém, distrito de Duque de Caxias no pé da serra fluminense. Tratando de um câncer, ele escolheu o local por ainda ser perto da capital, onde faz o tratamento, e por ser área longe do que chama de “estresses da cidade grande”.

“Atingi aqui uma tranquilidade e uma paz de espírito que não conseguia ter no Rio. O ritmo do mato é outro, o tempo passa de outra forma”, diz.

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