O ex-governador Sérgio Cabral (MDB), que está preso desde 17 de novembro de 2016 e já foi condenado a mais de 198 anos de prisão, afirmou ter trocado favores com o então chefe do Ministério Público do Rio (MPRJ) para garantir o arquivamento da investigação sobre a “farra dos guardanapos”. Sob esse nome, ficou conhecido um jantar realizado em Paris em setembro de 2009 do qual participaram Cabral, então governador, alguns secretários e correligionários e empresários que mantinham contratos com o estado. Vários foram fotografados com guardanapos na cabeça, daí a forma como o episódio ficou conhecido.
Cabral fez a afirmação durante depoimento prestado ao MPRJ em 25 de abril, na penitenciária de Bangu, onde está preso. O depoimento, tomado durante investigação contra o ex-procurador geral de Justiça Cláudio Lopes, foi obtido pela Globonews, que o divulgou nesta quinta-feira.
O ex-governador afirmou que à época conversou com o então procurador-geral Marfan Vieira Martins sobre a nomeação do então promotor Sérgio Nogueira de Azeredo, então chefe de gabinete de Marfan, para o cargo de desembargador. Em troca, a investigação seria arquivada.
“O Marfan conversou comigo, disse: ‘Olha, fique tranquilo, eu vou fazer uma gestão séria, limpa, eu sei do teu envolvimento com o Cláudio (Lopes, procurador anterior), eu sei do que o Cláudio é capaz de fazer em termos de constrangimento’. E aí eu nomeei o Marfan, talvez com um delay, uma demora mais do que eu havia feito três meses antes, no biênio do Marfan, e aí combinamos isso e o conselho arquivou”, contou Cabral.
Questionado se Marfan condicionou o arquivamento à indicação de seu chefe de gabinete para a vaga de desembargador, o ex-governador respondeu: “Ah, isso ficou implícito, isso ficou implícito que… isso era fruto de um acordo. ‘Vamos arquivar, o meu grupo vai votar com você e os votos do meu grupo não são suficientes para arquivar. É, procure o outro grupo’.”
Esse outro grupo, segundo Cabral, era liderado pelo promotor Marcos Chut, que – diz o ex-governador – também queria ser nomeado desembargador.
“O Marfan me procurou e disse: ‘Olha, nós estamos com problema no Conselho Superior. O Cláudio não terminou o trabalho, ele deixou esse abacaxi aqui, nós temos que concluir. Eu não tenho votos suficientes para arquivar’. Primeiro, eu tranquilizei ele e disse: ‘Doutor Marfan, o senhor fique tranquilo porque esse é um assunto que eu não tenho nada’. Então ele falou: ‘Há quem queira prejudicar’. E aí traçamos um plano em que houve, inclusive, um combinado político, que eu fizesse o Serginho – assim chamávamos o chefe de gabinete dele, Marfan – abriria uma vaga de desembargador do Estado e que… a outra parte do grupo do Conselho Superior era liderada pelo Marcos Chut, por pessoas ligadas ao Marcos Chut. E aí o Marcos Chut tinha o desejo de ser candidato (a desembargador) e o Marfan me disse: ‘Olha, eu não tenho como chegar a esse grupo, e o que eu tenho ouvido é que o Marcos Chut tem uma tendência a votar. O grupo lá… acho que você devia chamar o Marcos Chut pra uma conversa'”, afirmou Cabral ao MPRJ.
O ex-governador diz que chamou Chut para conversar. “Aí eu falei: ‘Marcos, eu queria pedir o teu apoio e me comprometer com você, que a primeira vaga (de desembargador) vai ser do Serginho. Queria até pedir o teu grupo pra votar com o Serginho e você ir pra segunda vaga, que talvez não seja comigo, seja com o Pezão (Luiz Fernando Pezão, então vice-governador e que assumiria o cargo com a renúncia de Cabral). Eu vou chamar Pezão aqui pra ele assumir esse compromisso’. Aí fizemos uma reunião e foi assumido esse compromisso de que a primeira vaga seria do Serginho. Eu o nomeei, saí em 3 de abril de 2014, eu nomeei o Serginho”.
O promotor Azeredo tomou posse como desembargador em março de 2015 e Marcos Chut dois meses depois, em maio do mesmo ano. Ambos foram eleitos para vagas do quinto constitucional, destinadas ao Ministério Público.